Brasileiros dançam com sauditas no parque do Ibirapuera em São Paulo no dia 8 de junho, 2014. (Foto por Rasheed Abou-Alsamh)
Rasheed Abou-Alsamh
Nunca pensei que ia ver sauditas dançando no Parque Ibirapuera, em São Paulo, mas foi exatamente isso que testemunhei no domingo passado. Esses dançarinos, todos homens, faziam parte do evento Dias Culturais da Arábia Saudita, organizado pelo Ministério da Cultura e Informação da Arábia Saudita.
E, se pensam que eu fui convidado, estão equivocados. Eu fiquei sabendo que esse evento cultural estava se desenrolando em São Paulo por acaso pelo meu e-mail na sexta-feira à noite. No e-mail havia um link para uma matéria da Agência de Notícias Brasil-Árabe (Anba) sobre o festival. Fiquei surpreso e excitado ao saber do evento e comecei a planejar minha ida a São Paulo para presenciar o evento de perto. Passagem e quarto de hotel pagos pela internet, eu voei de Brasília para São Paulo no sábado à tarde. No domingo de manhã estava no táxi rumo ao parque.
“Queremos nos aproximar do povo brasileiro porque nós o amamos e queremos uma relação mais próxima. Por isso, queremos nos expor culturalmente para que os brasileiros aprendam mais sobre nós”, disse o vice-ministro de Cultura saudita, Abdulaziz Almulhem, para a Anba. E se exporem culturalmente, os sauditas conseguiram.
Alojada numa tenda gigante ao lado do Museu Afro-Brasileiro no Ibirapuera, a área central era um palco para a apresentação dos vários grupos de dança folclórica com seus músicos acompanhantes. Em áreas adjacentes eram montadas cabines com artistas plásticos sauditas, de ambos os sexos, mostrando suas pinturas. A fotógrafa saudita Susan Baaghil, pioneira no ramo como a primeira mulher a montar um estúdio comercial na Arábia Saudita, ocupou um espaço grande tirando fotos de brasileiros vestidos em roupas tipicamente sauditas. Outra cabine bastante cobiçada pelas visitantes femininas foi a da hena, onde duas sauditas faziam desenhos bonitos nas mãos das mulheres usando uma pasta, uma decoração típica que mulheres árabes usam para ocasiões especiais como casamentos e festas. Outro estande concorrido foi o dos calígrafos sauditas, uma mulher e um homem, que desenhavam os nomes dos participantes em árabe usando várias tintas coloridas. Tudo isso foi regado com água de Zamzam — que é considerada milagrosa por muçulmanos por vir de uma fonte em Meca —, além de três toneladas de tâmaras importadas da Arábia Saudita.
A alegria dos dançarinos sauditas e dos brasileiros que lhes assistiam era contagiante. Eu acho que essa parte foi a favorita dos espectadores em São Paulo. Em certo momento, um dos grupos folclóricos começou uma dança na entrada principal, e em pouco tempo tinha atraído uma pequena multidão de brasileiros, batendo suas palmas ao ritmo dos tambores e de uma flauta, muitos dançando em uma roda ao redor dos músicos. Havia mulheres de shorts, um brasileiro fortão e sem camisa, todos saboreando os sons da música árabe numa manhã ensolarada de domingo. Que maravilha, pensei para mim mesmo, pena que essa cena não poderia acontecer na Arábia Saudita por causa da estrita separação dos gêneros em áreas públicas.
Enquanto esperei na fila para ter meu nome escrito em árabe, observei duas irmãs brasileiras dando uma olhada nas bijuterias sendo vendidas por um artesão saudita. Uma delas comprou um miniterço cor-de-rosa pela pechincha de cinco reais. “Vocês já conheciam algo sobre a Arábia Saudita antes de vir para cá?”, eu perguntei para uma delas. “Não, é a primeira vez que vimos alguma coisa sobre a Arábia Saudita”, ela me respondeu.
Outra parte que atraiu muita atenção foi a tenda beduína, onde visitantes podiam se sentar em cima de almofadas e tapetes coloridos e tomar café árabe e comer tâmaras, enquanto posavam para fotos.
Para mim, esse festival mostrou o poder incrível da diplomacia cultural e artística. É claro que, de certo modo, eventos como esse reduzem uma cultura tão rica e complexa como a saudita a uns clichês, como tâmaras e homens vestindo thobes, mas também são um forte elo para aproximar povos que veem similaridades nas músicas, danças e artes plásticas de cada um.
Mas foi ótimo ter um evento árabe que não apertava o teclado da política e dos levantes tão desastrosos da Primavera Árabe. O embaixador saudita no Brasil, Hisham Alqahtani, disse que espera que eventos culturais brasileiros possam acontecer na Arábia Saudita, para que os sauditas conheçam a cultura brasileira. Tomara mesmo.
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