A amazona saudita Dalma Rushdi Malhas quase consegui uma vaga nas Olimpiadas em Londres, mas nao vai porque o cavalo dela teve uma lesao.
Esse coluna foi publicada no O Globo no 29/06/2012:
Rasheed Abou-Alsamh
A morte do príncipe herdeiro saudita Nayef ibn Abdul Aziz (16/6) em Genebra, aos 78 anos, deixou alguns sauditas aliviados: o ministro do Interior, durão de longa data, não ia mais poder virar rei um dia. O ministro da Defesa, o príncipe Salman ibn Abdul Aziz, 77, um líder igualmente conservador, e por décadas o governador de Riad, foi nomeado pelo rei Abdullah ibn Abdul Aziz, 88, para ser o novo príncipe herdeiro.
Muitos observadores do reino nutrem a fantasia de que vão ver uma mudança para mais liberdade e uma abertura social quando um líder saudita morre. Mas a verdade é muito mais dura. De fato, é avançada a idade dos príncipes na segunda geração dos Al- Saud — todos filhos do fundador da Arábia Saudita moderna, o rei Abdul Aziz al-Saud —, mas a família real saudita é supercautelosa e faz tudo por consenso.
São esses atributos, que o escritor britânico Robert Lacey pensa que ajudaram a manter os Al-Saud no poder por tantas décadas, que são responsáveis por sinais contraditórios provenientes da família real, quando confrontada com questões polêmicas, como deixar mulheres dirigir carros ou participar dos Jogos Olímpicos.
Para muitos sauditas conservadores, o esporte para mulheres é uma coisa proibida, porque temem que garotas jovens podem “quebrar” seus hímens quando se exercitam demais , e isso causaria a perda de virgindade. Por isso mulheres são proibidas de participar de qualquer esporte no país, e a educação física para meninas é banida em todas as escolas publicas. Existem academias privadas onde mulheres podem malhar, mas são geralmente caras e com isso excluem a maioria das mulheres sauditas.
O Comitê Olímpico Internacional ameaçou banir três países dos jogos em Londres que nunca tinham mandado atletas mulheres para as Olimpíadas: a Arábia Saudita, o Brunei e o Catar. Para os sauditas, a amazona Dalma Rushdi Malhas, de 20 anos, era a possível salvação de não ser banido. No domingo passado, o embaixador saudita em Londres anunciou que a delegação saudita de atletas para os jogos olímpicos do mês que vem ia ter mulheres. Mas, no dia seguinte, a Federação Equestre Internacional anunciou que Malhas foi desqualificada de participar dos jogos porque o cavalo dela estava com uma lesão. Ela tinha participado das Olimpíadas da Juventude em 2010 em Cingapura e levado a medalha de bronze. Mas ela participou sem o apoio do comitê olímpico saudita, pagando da bolsa dela todas as suas despesas.
A ONG Human Rights Watch lançou em fevereiro deste ano uma campanha visando a essa discriminação contra as mulheres sauditas na área de esportes e educação física. Talvez essa campanha, juntamente com a possibilidade de ser banido das olimpíadas, fez com que o reino anunciasse que ia deixar mulheres participarem. Mas, como é de praxe com assuntos polêmicos, vários órgãos do governo não pareciam estar na mesma página sobre esse assunto, deixando a situação ainda mais confusa.
Vários ativistas viram a reviravolta saudita com cinismo, dizendo que era somente uma tática para evitar a vergonha de ser banido. “É justo que os sauditas joguem pelas regras olímpicas, mas uma mudança de última hora, para evitar a proibição, não altera as condições deploráveis e desiguais para as mulheres e meninas na Arábia Saudita”, disse Minky Worden, da Human Rights Watch.
Oficiais sauditas têm sugerido que talvez outras atletas sauditas irão participar das olimpíadas em Londres, possivelmente em esportes de pista e campo, que precisam de menos treinamento especializado. “Uma mulher saudita poderia também carregar a bandeira saudita na cerimônia de abertura”, sugeriu Worden.
Enquanto os sauditas brigam entre si, os catarianos estão mandando três atletas mulheres para os jogos, incluindo a atiradora Bahia Al-Hamad, uma nadadora e uma corredora. Brunei vai mandar uma mulher, Maziah Mahusin, uma corredora de barreiras de 400 metros.
Se uma mulher saudita participar das Olimpíadas em Londres vai ser mais um ato simbólico do que qualquer outra coisa. No reino ultraconservador, mulheres enfrentam obstáculos muito mais sérios do que poder ser atletas. A maior delas é a detutela masculina, a que toda mulher saudita é submetida para fazer qualquer coisa na vida. Para trabalhar, viajar e até estudar no estrangeiro, mulheres precisam do aval do seu guardião, que pode ser seu pai, marido ou irmão.
Com a alta taxa de obesidade e diabetes na população saudita, especialmente nas mulheres, eu acho essencial que o governo institua aulas de educação física para todas as meninas e mulheres nas escolas e universidades públicas, e deveria incentivar o esporte em geral para todos. Oficiais sauditas têm prometido que aulas de educação física vão ser introduzidas em escolas públicas em breve. Tomara que não demorem.
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