Uma mesquita feita de arame, do artista saudita Ajlan Gharem.
Por Rasheed Abou-Alsamh
Esses inovadores usam fotografia digital, pintura e instalações grandes para se expressar e envolver o espectador
Um grupo de jovens artistas contemporâneos sauditas está causando sensação no país e no Oriente Médio inteiro com suas obras modernas, que questionam alguns dos tabus mais controversos da sociedade.
Reunidos num coletivo de arte chamado “Edge of Arabia”, ou “Beira da Arábia” em tradução livre, 20 homens e 18 mulheres moradores do reino estão produzindo algumas das obras de arte mais modernas e sofisticadas que já vi. Ao contrario dos artistas sauditas mais tradicionais, que só pintam paisagens ou imagens abstratas, esses jovens inovadores usam fotografia digital, pintura e instalações grandes para se expressar e envolver o espectador.
Ajlan Gharem, um jovem saudita que nasceu em Khamis Mushayt, no sul do país, e que agora ensina Matemática numa escola pública na capital, Riad, recentemente fez uma mesquita pequena, toda de arame, completa, com um minarete no qual se acendem luzes verdes à noite. Fiéis podem entrar e rezar, e há um xeque para liderar as cinco rezas do dia.
“Eu acho que nossas mentes tentam achar alguma coisa em que acreditar. Por isso, eu construí uma mesquita como uma jaula,” explicou Gharem para a BBC News. “Às vezes, eu fico confuso em dizer se eu construí uma mesquita como uma jaula ou uma jaula como uma mesquita. A velha geração tem mais crenças do que conhecimentos, e nossa geração tem mais conhecimentos do que crenças. Então, nós estamos procurando achar crenças que possam ser harmonizadas com nosso conhecimento.”
Outro talento impressionante é Shaweesh, um jovem artista de rua de Riad, que começou como grafiteiro em 2009 e expandiu seus horizontes para a arte digital. Ele grafitou a figura da atleta Sara Attar — que foi umas das primeiras mulheres sauditas a competir nas Olimpíadas, em 2012 — em muros da capital saudita. Shaweesh também fez uma pequena escultura de um professor que marcou a vida dele negativamente, retratado com uma bomba-relógio nas costas para significar que queria explodir essa pessoa.
“Quando eu estava na escola, desenhava muito bem, mas o professor vinha e dizia que era bom, mas que eu não podia fazer aquilo. Minha ideia foi fazer uma escultura dessa mesma pessoa que não me deixou desenhar e botar um gatilho atrás para destruí-la,” disse Shaweesh à BBC News. “Eu não poderia ter feito isso há dez anos. Se eu tivesse feito isso naquele tempo, seria um desastre. Mas, agora, as pessoas são mais abertas a novas ideias.”
O “Edge of Arabia” foi fundado em 2003 pelos artistas sauditas Ahmed Mater e Abdulnasser Gharem e o britânico Stephen Stapleton. A primeira grande exposição do grupo foi em 2008, em Londres, e foi um sucesso enorme. Depois houve mostras em Berlim (2010), Istambul (2010), Dubai (2011), na Bienal de Veneza (2011), em Jedá (2012) e em Londres, de novo em 2012.
As decanas desse grupo são as irmãs Shadia e Raja Alem, que são da cidade sagrada de Meca, mas moram entre Paris e Jedá. Elas fizeram a instalação do pavilhão da Arábia Saudita no Bienal de Arte de Veneza em 2011. Num galpão enorme, puseram no alto um espelho enorme, redondo, no mesmo ângulo de outro circulo no chão, feito de bolas de metal. Em cima desse círculo havia um retângulo preto, feito de aço inoxidável, suspenso sobre uma ponta. Sobre tudo isso elas projetaram várias imagens e sons.
Outro membro muito interessante do coletivo é Ahmed Mater, que nasceu em Abha, no sul do país. Uma obra instigante dele é a serie de fotos intitulada “Magnetism”, que mostram um ímã retangular e preto cercado de aparas de metal. Lembram o Kaaba, em Meca, o cubo preto no centro da Mesquita Sagrada, ao qual todos os muçulmanos dirigem suas preces diárias para Deus, cercados por fiéis fazendo a circunvolução do prédio. Visitem o site deles (www.edgeofarabia.com), para ver fotos e vídeos das obras de todos os artistas.
Para financiar tudo isso, o coletivo conta com o apoio de várias entidades privadas, a maior delas a Art Jameel, um dos braços filantrópicos da empresa Abdul Latif Jameel, a concessionária da Toyota na Arábia Saudita. A Art Jameel tem uma longa parceria com o Victoria e Albert Museu, em Londres, onde eles são os patrocinadores do Prêmio Jameel para arte contemporânea e design inspirados pela tradição islâmica.
O carimbo gigante do artista saudita Abdulnasser Gharem.
Finalmente, há o artista Abdulnasser Gharem, que faz instalações grandes usando objetos do dia a dia de qualquer saudita, como um carimbo gigante (encontrado em repartições públicas), e os blocos de concreto que cercam instalações do governo e ficaram oblíquos depois dos ataques terroristas do grupo al-Qaeda no reino, de 2004 a 2007.
Esse grupo de artistas está na vanguarda de tudo o que há de mais novo e conceitual no mundo artístico. Com seus olhares críticos sobre a sociedade saudita, esses jovens artistas não aceitam a sociedade come ela é, e ficam perguntando “por quê?” o tempo todo e desafiando o status quo. Espero que consigam continuar a crescer e a tocar as vidas de cada vez mais sauditas.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/jovens-artistas-sauditas-surpreendem-18611959#ixzz40WQvWUMY
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